terça-feira, 11 de março de 2008

CONTESTAÇÃO

Jorge Alves, Noémia Rodrigues, João Oliveira, Francisco Vicente, Marília Russo, residentes na freguesia de Prazeres de Aljubarrota Concelho de Alcobaça, membros do movimento cívico ATAC (Amigos da Terra por Amor à Camisola).

Após leitura e reflexão da Declaração de Impacto Ambiental do projecto “Ligação Ferroviária de Alta Velocidade entre Lisboa e Porto, Lote C1 – Troço Alenquer (Ota) / Pombal”, emitido pelo MAOTDR, ficaram verdadeiramente surpreendidos com a facilidade e ligeireza como o MAOTDR pode emitir uma declaração de impacto ambiental favorável à alternativa CSN 11 (SE+LE+NB), embora condicionada, quando o estudo que a suscitou se encontra tão incompleto e com impactos altamente graves a vários níveis, desta forma vêm apresentar a sua CONTESTAÇÃO.
I - Ocupação humana

A passagem do TGV irá ser responsável pela separação de núcleos urbanos consolidados, com alterações na dinâmica urbana e social existente, além de eventuais desequilíbrios funcionais.

Conduzirá à fragmentação do território, com consequente isolamento de núcleos existentes ou alteração das actuais dinâmicas de expansão urbana.

Estes efeitos serão considerados permanentes, uma vez que a perturbação dos mesmos se faz sentir durante todo o tempo de vida do projecto.

Há ainda a referir, que a RAVE no seu desejo de tudo impor e a ninguém respeitar, põe em causa a Capela de S. João Baptista, nos Olheiros, freguesia de S. Vicente de Aljubarrota, que é considerada património nacional. Esta capela sofreu obras de restauro à pouco tempo, que foram financiadas pela Freguesia de S. Vicente de Aljubarrota, Câmara Municipal de Alcobaça e IPPAR.
Trata-se de uma Capela renascentista, que está datada de 1606, em que o telhado do altar-mor é construído em abóbada e cujas paredes laterais são suportadas por contrafortes com cerca de metro e meio de largura. Toda a sua estrutura ficará em risco, quer na fase da obra da infra-estrutura, quer posteriormente com as vibrações provocadas pela passagem do TGV.

Esta passagem do TGV no Concelho de Alcobaça espartilha oito freguesias, provoca um condicionamento para futuras localizações urbanas e industriais, com consequente desvalorização patrimonial dos habitantes locais bem como a degradação da sua qualidade de vida, com prejuízo da sustentabilidade caminhando assim para o esvaziamento da área, entre a Serra dos Candeeiros e a zona de implantação ferroviária.

II - Património geológico / geomorfológico (carso)

Na plataforma que se estende desde a Serra dos Candeeiros até Alcobaça - Maciço calcário estremenho - a mais importante zona calcária de Portugal, datada do Mesozóico. As formas cársicas superficiais predominantes são os lapiás as depressões, dolinas de que são exemplo a depressão da Ataíja e as dolinas de Lagoa do Cão e Casal do Rei. Em profundidade a carsificação traduz-se em galerias, grutas e algares.

Desde o ano de 2005 que espeleo-mergulhadores, do Núcleo Espeleológico de Alcobaça (NEALC), tem vindo a estudar o vale da Ribeira do Mogo, onde no sistema do Rio Alcôa localizaram mais 2 nascentes, 3 sumidouros e 2 algares. Um deles encontra-se com um sifão a 80 metros de profundidade. Cfr. doc. nº 1.

A ADEPA – Associação para a Defesa e Valorização do Património Cultural da Região de Alcobaça localizou 13 grutas, algumas das quais, datadas do Período cronológico: Neolítico, calcolítico, Idade do Bronze, Idade do Ferro, Época Romana e outras, ainda não devidamente estudadas. Cfr. Doc. nº 2.

Num relatório paroquial da Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres, pode ler-se:
“Aljubarrota, que no arabigo quer dizer campina aberta, há uma vila antiquissima, … e sem embargo que não há certeza da sua fundação; poucos annos, há se descobrio junto della numa pedra, da qual já não há notícia, por onde constava ser a sua fundação, dos tempos dos romanos…”

Sabe-se que próximo de Aljubarrota existiu uma grande cidade Romana a que chamavam Arruncia.

No Dicionário corographico de Portugal Continental e Insular pode ler-se:

“Defronte da villa a 200 metros de distância vêem-se alguns vestigios da antiquissima egreja de Santa Marinha (ainda vêem no adro sepulturas de eras remotíssimas, com dizeres e instrumentos agrícolas esculpidos). Teem-se aqui achado moedas romanas de prata.”

Também segundo a Associação Ambientalista SILEX, formada por cidadãos residentes na zona do Vale da Ribeira do Mogo (Carvalhal de Aljubarrota) e muito conhecedores deste espaço, foram detectadas e registadas em GPS 40 cavidades.

III - Recursos hídricos

Em profundidade a carsificação traduz-se em algares, galerias e condutas, formando um aquífero cársico muito heterogéneo, com elevado grau de organização da drenagem subterrânea. Na Lagoa do Cão e Covões, a água pouco visível à superfície, abunda no subsolo, fazendo desta zona um dos maiores reservatórios, subterrâneos de água doce da Europa. A alimentação deste reservatório faz-se principalmente pela chuva que, infiltrando-se rapidamente no subsolo, forma ribeiras subterrâneas.

Por esta razão em Dezembro de 1994, foi elaborado pelo GITAP o relatório do PDM, para o Concelho de Alcobaça, em que se justificava a necessidade de se constituir REN (Reserva Ecológica Nacional), nos lugares de Lagoa do Cão e Covões, por se encontrarem em zona de infiltração máxima, ficando o seu uso condicionado nos termos do Decreto-Lei nº 180/2006, que revoga entre outros o Artº. Nº. 12 do Decreto-Lei nº 93/90 de 19 de Março.

No caso de Chiqueda, a nascente cársica é também alimentada pelas águas das ribeiras do oeste, que compõem a bacia hidrográfica do Lis, cujo percurso se faz subterraneamente por Porto de Mós, Ribeira do Vale do Mogo nas freguesias de Prazeres e S.Vicente de Aljubarrota, até à nascente de Chiqueda.

A infra-estrutura (TGV) prevista de acordo com o estudo prévio e não devidamente estudado no terreno irá atravessar a linha de água no vale da Ribeira do Mogo. Tendo em conta que esta nascente em Chiqueda é responsável pelo fornecimento de água potável a cerca de 70% da população do concelho de Alcobaça, abrangendo as seguintes freguesias:
ALCOBAÇA, ALFEIZERÃO(só a localidade de Casal Pardo), BÁRRIO, BENEDITA, CELA, ÉVORA DE ALCOBAÇA, MAIORGA, PRAZERES DE ALJUBARROTA, S. VICENTE DE ALJUBARROTA, TURQUEL, VESTIARIA, VIMEIRO

A captação de Chiqueda abastece uma população de 42 000 habitantes, com um consumo médio diário ano de 12 350m3 de água.

Os aquíferos cársicos possuem uma capacidade pequena de reacção à poluição das águas subterrâneas devido a uma ausência quase total de filtração.

A inevitabilidade do desgaste e corrosão, quer dos carris em aço que constituem a ferrovia, quer das rodas do material circulante irão criar um impacto ambiental negativo, provocado pelos metais pesados utilizados no fabrico das mesmas.

O desgaste destes materiais será responsável por fornecer ao solo Vanádio (V), Crômio (Cr), Molibdénio (Mo), Titânio (T), Nióbio (Nb), Zinco (Zn), Chumbo (Pb) e Alumínio (Al), entre outros metais pesados. A maioria destes metais atingirá os cursos de água subterrâneos por meio de canais de escoamento de águas pluviais, infiltração ou escorrência.

A construção da referida infra-estrutura, para passagem do TGV, está prevista a cerca de 300 metros em linha recta, da principal fonte de captação de água (CHIQUEDA), para abastecimento ao Concelho de Alcobaça (freguesias acima citadas). Saliente-se o facto de o PDM impor uma protecção a esta nascente de 500 metros.

IV - Ecologia Flora/Fauna

a) Flora
Aqui encontramos muitas espécies vegetais, que não se encontram em mais nenhum local – endemismos.

Actualmente ainda subsistem vestígios de um coberto vegetal primitivo, sobretudo sob a forma de carvalhais constituídos por carvalho-cerquinho (quercus faginea), medronheiro (arbustus unedo), alecrim, sobreiro, azevinho, loureiro, carrasco entre outras espécies.

b) Fauna
No que diz respeito às espécies animais, povoam este espaço, mamíferos, aves, répteis, anfíbios, destacando-se a presença de morcegos, geneta, raposa, lontra, gato bravo, tourão, gralha-de-bico-vermelho, bufo-real (15, sendo 8 juvenis no ano reprodutor de 2007), corvo, águia de asa redonda (milhafre), víbora-cornuda, salamandra-de-fogo e sapo-de-unha-negra entre outros.

A grande diversidade biológica é sustentada pela existência de uma heterogeneidade de habitats.

Ao rasgar o território com a infra-estrutura do TGV, destroem-se os ecossistemas e dividem-se os habitats que existem, comprometendo a preservação das espécies.

V - Ruído

O ruído constitui um dos factores de qualidade ambiental em que o projecto TGV terá um impacto negativo.

Estudos realizados por investigadores do Imperial College de Londres, revelaram que a tensão arterial aumenta significativamente quando se experimenta um acontecimento nocturno com ruído superior a 35 decibéis, ou seja um valor substancialmente inferior aquele que está previsto na Declaração de Impacte Ambiental (60 e 50 decibéis).

Segundo o mesmo estudo uma subida de 10 decibéis de ruído nocturno causa um aumento de 14% no risco de hipertensão.

Há ainda a acrescentar que as pessoas submetidas a ruído que as tenham perturbado e frustrado os estados de atenção, concentração ou comunicação, ou que tenham sido afectadas na sua tranquilidade, descanso ou no sono desenvolvem alguns síndromas tais como: cansaço crónico, tendência para terem insónias, doenças cardiovasculares (o risco de ataques de coração em pessoas submetidas a valores superiores a 65 dB (A) no período diurno, aumenta entre os 20 e 30%), transtornos no sistema imunitário responsável pela resposta às infecções e aos tumores, transtornos psicofísicos como a ansiedade, depressão, irritabilidade, náuseas, enxaquecas e ainda variações de conduta, especialmente comportamentos anti-sociais tais como a hostilidade, intolerância e a agressividade.

O ruído dos comboios é classificado de fatigante/perigoso na escala do ruído.

VI - Vibrações

No passado a água sempre foi um dos principais problemas das populações dos lugares da base oeste da Serra dos Candeeiros, do qual destacamos por melhor conhecermos os lugares de Termo de Évora, Lagoa do Cão, Covões, Casal do Rei e Ataíja de Baixo. Devido à natureza calcária dos solos era inútil abrir poços, daí a necessidade do homem inventar maneiras de reter a água da chuva, surgiram as cisternas, como reservatório para conservação da água.

Assim, eram aproveitados pequenos algares para este fim, como ainda hoje se pode verificar.

Esta zona é bastante instável, dada a proximidade da falha da Nazaré – Pombal, onde se pensa que tiveram origem os sismos de 1528 e de 21 de Fevereiro de 1890.

De acordo com o Decreto-Lei nº 235/83, de 31 de Maio é possível considerar em Portugal Continental uma zonagem sísmica, correspondendo esta zona a uma 2ª faixa de grande instabilidade.

Na zona prevista para a passagem do TGV, há que ter em consideração que parte do casario não descarrega em pilares, mas sim em banda, o que constitui um risco acrescido com as vibrações provocadas pela passagem do TGV.

VII - Radiações electromagnéticas

Cientistas internacionais alertam para os perigos das radiações electromagnéticas que têm um impacto negativo na saúde, sendo responsáveis por casos de leucemia infantil, tumores cerebrais, neuroma acústico e Alzheimer.

Constituindo um factor de risco para o cancro, tanto em crianças como em adultos.

Para o TGV poder funcionar é imprescindível que haja corrente eléctrica de alta ou de muito alta tensão, o que irá provocar radiações electromagnéticas. O ministério do Ambiente não pode ignorar os efeitos cancerígenos que estas radiações provocam. Aliás a Direcção Geral de Saúde tem em seu poder um relatório referente a esta matéria.

VIII - Citando a SIC

O estudo de impacto ambiental da RAVE é também duramente criticado no parecer: “elege um conjunto de alternativas designadas por “alternativas ambientalmente mais vantajosas”, as quais são fortemente impactantes. Esta atitude reflecte que houve uma subavaliação da magnitude dos impactos, no seu todo, pelo que nenhuma das soluções apresentadas possa ser considerada como viável, neste contexto”.

No parecer antes emitido, e que tinha sido aprovado e enviado para a Agência Portuguesas de Ambiente pelo Vice-presidente Henrique Moura Maia da CCDRC, explicava-se que “os impactos gerados em termos de socio-economia, do ordenamento do território e usos do solo são negativos, muito significativos, irreversíveis e não minimizáveis (residuais)”, permanecendo mesmo depois das medidas de minimização prevista no Estudo de Impacto Ambiental promovido pela RAVE.

O parecer negativo da Comissão de Avaliação do Projecto, tal como foi feito inviabilizaria inevitavelmente os traçados propostos pela Rede de Alta Velocidade (RAVE) para o atravessamento na zona entre a Ota e Pombal.

O Vice-presidente da CCDRC, Henrique Moura Maia, fez o frete à Agência Portuguesa do Ambiente “as alternativas podem ser todas más
mas, decididamente havia que hierarquizá-las” porque “quem vai decidir, vai ter que saber qual é a menos má”.

Os técnicos não aceitam a pressão, como explicam num relatório a que a SIC teve acesso e arquivado na CCDRC (está assinado pelos próprios
técnicos ): “Esta posição não pode ser aceite (…) dado que todas / as alternativas / apresentam impactes negativos muito significativos”.

Respondem ainda que “ uma eventual hierarquização, a ter sido possível teria naturalmente constado do parecer dias antes homologado superiormente”.

Fim de citação

Ficamos assim a saber, que neste país à beira mar plantado, que alguns o querem transformar em medíocre, não se escolhem traçados para implantação de projecto ferroviário de alta velocidade, cujo custo rondará se não houver derrapagem 4,5 mil milhões de euros, pelo facto de serem BONS ou MUITO BONS, mas contentamo-nos com o MENOS MAU.

Conclusão

Face ao exposto é visível, e óbvio, que a passagem do TGV vai trazer ao Concelho de Alcobaça e ás suas gentes, nomeadamente a 8 das suas freguesias, um ónus que as populações e o Concelho não vão conseguir reparar nem recuperar.

Passagem essa que foi avaliada, pelos técnicos competentes da CCDRC, que referiram um enorme impacto sobre a população nomeadamente: sobre o património geológico; geomorfológico (carso); recursos hídricos; ecologia: flora e fauna; ruído; vibrações e radiações electromagnéticas, etc.

A avaliação dos técnicos da CCDRC incumbidos daquele processo foi peremptória ao afirmar que os impactos da passagem do TGV são “negativos muito significativos e não minimizáveis”.

Mais afirmam os técnicos que em resultado do estudo feito e das opções apresentadas, todas com um grande impacto social, ambiental e outras, que não era possível “uma eventual hierarquização, a ter sido possível teria naturalmente constado do parecer, dias antes homologado superiormente”.

Mas, os técnicos que analisaram os vários traçados e que denunciaram os impactos que estes vão ter junto das populações e do Concelho, foram afastados do processo e foram substituídos por outras pessoas.

Pessoas essas cujas competências e conhecimento dos factos podem ser postos em causa pois, decidem a aprovação de um traçado com os efeitos já referidos como sendo o “menos mau”.
E decidem sem ter em atenção os pareceres dos técnicos (fundamentados) e fundamentam as decisões que tomam unicamente com o pretexto de ser o “menos mau”.

Não é, pois, possível nem admissível que um projecto desta envergadura e dimensão para o país e para as populações locais seja decidido com o fundamento de ser o menos mau, daí a indignação dos signatários, bem como das populações locais, em relação à passagem do TGV pelo Concelho de Alcobaça, pelo traçado agora escolhido, ou por qualquer outro dos que foram analisados pelos técnicos CCDRC e qualificados como tendo impactos “negativos muito significativos e não minimizáveis”.

Requer-se ainda que seja averiguada:

- em que condições foi feita a aprovação do traçado do TGV na ligação Ota Pombal, que passa pelo concelho de Alcobaça;
- porque é que o traçado aprovado foi contra o parecer inicial dos Técnicos do CCDRC responsáveis por ele;
- qual a razão do afastamento dos 2 técnicos da CCDRC nomeados inicialmente para elaborar aquele parecer.

Mais se requer que seja averiguado:

1 – Se existe necessidade que Portugal faça um investimento tão elevado, numa altura de “apertar o cinto”, já que a linha do TGV de Lisboa – Porto, vai retirar apenas 15 minutos ao tempo de viagem que o Alfa Pendular demora hoje;

2 – Tendo em conta que o traçado TGV foi concebido para localização do Aeroporto em Ota, não faz qualquer sentido manter o traçado de passagem
entre Serra de Montejunto e Serra dos Candeeiros, uma vez definida a nova localização do NAL em Alcochete;

3 – Se, se mantém, a intenção de fazer a ligação do traçado do TGV ao novo de Aeroporto de Lisboa, em Alcochete, não será de concluir que o traçado mais vantajoso para este, seja a Este da Serra dos Candeeiros ou junto á A1,.fazendo que o traçado do TGV não passe pelo Concelho de Alcobaça;

Retirando-se o traçado do TGV no concelho de Alcobaça, esta população e o meio ambiente agradecem e assim se fará uma JUSTIÇA SOCIAL E AMBIENTAL.
Juntam – 2 documentos

P. D. V. Exa.

Os Signatários acima nomeados
Foi dado conhecimento desta mesma Contestação a:
PS; PSD; CDS – PP; OS VERDES – PEV; PCP; Bloco de Esquerda; Deputada Zita Seabra; Comissão Parlamentar do Poder Local do Ambiente e Ord. do Território; Comissão Parlamentar das Obras Públicas; Ministério do Ambiente; Ministério dos Transportes; Procurador Geral da República; Presidente da República.

1 comentário:

Lúcia Duarte disse...

parabéns, uma contestação bem feita e bem fundamentada.
só cidadãos politicamente desinteressados têm uma atitude destas.
è um orgulho para Aljubarrota ter cidadãos tão atentos a defender o nosso ambiente e património.
bem-hajam!