sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

RAVE CRIA ....... MAIA APADRINHA .........

TGV avança contra técnicos


Afastados autores de parecer que chumbava traçado de alta velocidade



Um organismo do Governo (a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro - CCDRC) pressionou dois técnicos superiores a mudarem um parecer que chumbava todos os traçados de TGV entre Alcobaça e Pombal. De acordo com o que apurou esta investigação exclusiva da SIC, os técnicos não aceitaram a pressão e foram, por isso, afastados compulsivamente da Comissão de Avaliação do projecto.






A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) emitiu um parecer desfavorável a todos os traçados previstos pela Rede de Alta Velocidade para a ligação entre Alcobaça e Pombal. O parecer, elaborado por dois técnicos superiores, foi aprovado por toda a hierarquia da CCDRC e enviado para Lisboa. Apenas cinco dias depois de terem aprovado o documento, os dirigentes da CCDRC mudaram de posição. Directamente dependentes do governo, queriam agora que o parecer indicasse qual era o traçado mais favorável.

"Foi a própria Comissão de Avaliação que nos colocou essa questão", disse à SIC o vice-presidente da CCDRC, Henrique Moura Maia, reconhecendo pressões superiores para alterar o conteúdo do parecer. Um parecer negativo desta comissão inviabilizaria inevitavelmente os traçados propostos pela Rede de Alta Velocidade (RAVE) para atravessamento da zona entre a Ota e Pombal. Apontar um traçado como menos mau foi uma forma de contornar a situação.

Na entrevista à SIC, o vice-presidente Henrique Moura Maia diz que "as alternativas podem ser todas más mas, decididamente, havia que hierarquizá-las" porque "quem vai ter que decidir, vai ter que saber qual é a menos má". Com esta alteração no parecer, o Governo já poderia viabilizar um dos traçados, como de resto aconteceu a 21 de Dezembro quando o Ministério do Ambiente emitiu a Declaração de Impacto Ambiental favorável ao projecto.


Impactes negativos irreversíveis e não minimizáveis





No parecer antes emitido, e que tinha sido aprovado e enviado para a Agência Portuguesa de Ambiente pelo vice-presidente da CCDRC, explicava-se que "os impactes gerados em termos de socio-economia, do ordenamento do território e usos do solo são negativos, muito significativos, irreversíveis e não minimizáveis (residuais)", permanecendo mesmo depois das medidas de minimização prevista no Estudo de Impacto Ambiental promovido pela RAVE. O Estudo de Impacto Ambiental da RAVE é também duramente criticado no paracer: "Elege um conjunto de alternativas designadas por "alternativas ambientalmente mais vantajosas", as quais são fortemente impactantes. Esta atitude reflecte que houve uma subavaliação da magnitude dos impactos, no seu todo, pelo que nenhuma das soluções apresentadas possa ser considerada como viável, nesse contexto".


Destituição por telefone


A CCDRC mudou de posição no mesmo dia em que o estudo estava a ser discutido pela Comissão de Avaliação de impacto ambiental do projecto (Troço de Alta Velocidade C1, entre a Ota e Pombal). A reunião era decisiva, mas uma hora depois de ter começado foi interrompida por um telefonema do vice-presidente e do presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro - queriam que os técnicos superiores escolhessem uma das alternativas propostas. Os técnicos não aceitaram a pressão, como explicam num relatório a que a SIC teve acesso e arquivado na CCDRC (está assinado pelos próprios técnicos): "Esta posição não pode ser aceite (...) dado que todas /as alternativas/ apresentam impactes negativos muito significativos". Responderam ainda que "uma eventual hierarquização, a ter sido possível, teria naturalmente constado do parecer dias antes homologado superiormente". Na administração pública os técnicos não podem ser coagidos a aceitar ordens que considerem violadoras da lei. O resultado foi a destituição pura e simples: "Perante as objecções levantadas (...) o sr. presidente da CCDRC retirou-lhes a confiança (...) tendo adiantado que iria proceder à nomeação de novos representantes" regionais na Comissão de Avaliação do projecto.


Autor da pressão recusa explicações


O presidente da Autoridade de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) reconhece o conflito para viabilização de um dos traçados de TGV. Em entrevista à SIC, António Gonçalves Henriques (também director-geral da Agência Portuguesa de Ambiente) diz que se tratou de "um problema que nós tivemos que gerir com a CCDR do Centro". O vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro não nega que os técnicos tenha sido afastados por recusarem ceder a pressões do presidente da CCDRC (Alfredo Rodrigues Marques) e de si próprio.: "Não lhe vou dizer porque é que eles foram mudados, isso é uma questão de gestão interna e isso aí não me vai perguntar", disse à SIC antes de repetir, com veemência: "Já me fez três vezes a mesma pergunta, porque é que os técnicos foram mudados! É uma questão de gestão interna da casa, pura e simples, e agradecia que essa questão não me voltasse a colocar, tá bom?!"


Parecer assinado por licenciado em engenharia electrotécnica





No dia seguinte ao telefonema, Henrique Moura Maia fez substituir os técnicos superiores por uma chefe de serviços e uma directora da CCDRC que já se apresentaram na reunião seguinte da Comissão de Avaliação do projecto. A Comissão de Avaliação é composta por representantes de onze entidades diferentes e emiteu um parecer que foi depois entregue ao Governo. As actas das reuniões decisivas da Comissão de Avaliação podem conter informação relevante sobre o "incidente" e o que se passou a seguir no interior da referida comissão mas, estranhamente, não contam do processo que a SIC pediu para consultar na íntegra (a consulta é pública e a disponibilização de todos os documentos obrigatória). A primeira reunião com os novos representantes da CCDRC discutiu um parecer adicional deste organismo que indica a chamada alternativa NB como a mais favorável de todas as soluções apresentadas pela RAVE. O parecer apresenta uma nova grelha de avaliação dos impactos anotados pelos técnicos superiores que tinham elaborado o parecer negativo e tem uma curiosidade: não está assinado por nenhum técnico superior mas apenas pelo vice-presidente Henrique Moura Maia, licenciado em engenharia electrotécnica (ver currículum vítae detalhado em:http://www.ccdrc.pt/ccdrc/vice-presidencia).


José Manuel Mestre - Jornalista




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