Parto de Lisboa para o Algarve de comboio, mais precisamente no conforto eficiente do Alfa-Pendular. Ao chegar ao meu destino exactamente duas horas e meia depois, embalada pelos 220 km/hora, pergunto-me o que levará o Governo de um país pobre e altamente endividado a insistir em endividar as próximas dez gerações de portugueses que terão de pagar o TGV que chega aos 300 km/hora. O traçado Lisboa-Madrid, ainda vá: é o compromisso internacional, é o ambiente, é o petróleo, é… enfim. Mas o custo/benefício de poupar 15 minutos no Lisboa-Porto, e ligar Porto a Vigo em alta velocidade, só poderá ser encontrado com a ajuda de ciências do oculto.
Em contrapartida, não será necessária qualquer ajuda de tecnologia portuguesa, pois todo o material circulante será 100% estrangeiro. Ficamos com a mão de-obra. Mais. Um estudo encomendado pelo Parlamento Europeu (PE) já avisou que o traçado do TGV terá uma derrapagem de 40,6% em relação ao custo previsto, devido a "problemas de gestão dos projectos, na planificação, na falta de financiamentos e atrasos". A sério!? Derrapagem? Problemas de planificação? Era preciso explicar ao PE que não vale a pena gastar dinheiro nesses estudos, ou não fosse "a derrapagem" a maior obra pública de Portugal. Como se viu esta semana no lançamento dos concursos para 6 novos lanços de estrada, começamos logo a derrapar: o custo calculado era de 1.800 milhões de euros, mas a proposta mais baixa já "derrapa" 40% em relação a essa estimativa. Assim, de repente, e sem nenhum estudo do PE, atrevo-me a fazer 3 apostas: que a derrapagem andará pelos 100%; que serão necessárias reparações um ano depois de concluída a obra; e que nunca serão apuradas responsabilidades.
Voltando ao TGV, o Governo vai embrulhar a conversa em papel de seda, dizendo que é tudo pago por privados e pela Europa, e, uma vez mais, arrisco-me a apostar que nunca vamos perceber quem é responsável pelos atrasos, erros e, obviamente, derrapagens em relação à estimativa actual de 11 000 milhões de euros. Nem o vamos saber até ao fim da obra, pois durante o período de construção os custos do investimento não entram no Orçamento do Estado. Só a partir da exploração, prevista para 2015, é que começamos a pagar a factura, até lá desconhecida, mas certamente a somar às "suaves" prestações de 1.000 milhões de euros/ano por essas grandes apostas chamadas SCUT, Estádios do Euro’2004 e juros bonificados do crédito jovem.
Teresa Caeiro
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